A presidente vai bem no tratamento das acusações contra membros da equipe dela, mas agora está desafiada pelo baguncismo. Que não rima com profissionalismo
A lógica acaciana informa: tudo vai bem até ir mal. A presidente Dilma Rousseff ia bem nos episódios de acusações contra membros do governo. Tomava providências e projetava imagem de rigor.
De dureza contra a corrupção. O que se espera de quem vai sentado na cadeira presidencial.
Dilma vinha atendendo a demanda. E com o destemor de quem não reza pela cartilha alheia.
O episódio no Ministério do Turismo introduziu elementos perturbadores na relação da presidente com o ambiente político-policial.
Houve o desconforto pelas implicações políticas. Paciência. A PF não precisa de autorização do Palácio do Planalto para fazer o trabalho dela.
Foi um primeiro mau jeito. O Planalto não tem prerrogativa legal de exigir saber antes como a PF vai tocar um caso.
Desde que a força policial aja dentro da lei. E das normas hierarquicamente determinadas.
Agora, vem esta inacreditável exposição dos investigados, ou pelo menos de alguns deles, politicamente mais apetitosos.
Fotografados sem camisa, em situação humilhante na cadeia.
Dirá o senso comum ser bom políticos suspeitos de crimes receberem o mesmo tratamento desrespeitoso dado aos do povo.
Para que os de cima vejam como é bom para a tosse, sintam na pele.
Será?
Melhor seria percorrer a estrada oposta. Garantir a todos os direitos previstos na lei e aplicados apenas para alguns, mais bem posicionados e munidos.
O arbítrio e a violência, inclusive moral, contra alguém “da alta” não ajuda a estimular o respeito aos direitos humanos dos demais.
Ao contrário.
Ao institucionalizar-se a ausência de limites, legitima-se alguma perseguição a graúdos, mas junto complica-se para valer a vida dos nem tanto.
Pois os primeiros costumam ter dinheiro, prestígio e relações para mobilizar na hora do aperto.
Já o povão só tem mesmo a esperança de ver a lei cumprida. Especialmente os pedaços dela dedicados aos direitos e garantias individuais.
O arbítrio é sempre para todos. Especialmente para os menos providos de defesas materiais.
Por isso, é ilógico exultar diante da violência contra quem achamos que “merece”. Isso não promove justiça social.
Pois amanhã a violência socialmente legitimada pode se voltar contra qualquer um.
O episódio do Ministério do Turismo apresenta elementos de regressão no profissionalismo que a PF havia alcançado nos últimos anos.
Quando conteve o espetáculo e se concentrou na produção de resultados capazes de facilitar a condenação.
A PF é essencial, mas não substitui o Ministério Público nem a Justiça.
Ainda que, num ambiente percebido como de impunidade, o povão adore a justiça sumária.
Desde que para os outros, claro.
O caso vem infelizmente revelando uma dose de baguncismo, que pode dar ainda muita dor de cabeça à presidente da República.
Que, em vez de se deixar tentar por controlar politicamente o trabalho da PF, talvez devesse lançar o foco sobre o exigido profissionalismo.
Inclusive para não enfraquecer a própria Polícia Federal.
Fora de lugar
As ideias são decisivamente influenciadas pela realidade material.
Mas é verdade também que isso acontece com atraso. As ideias velhas resistem pela força do hábito, da inércia.
O governo anterior do PT aceitou uma polarização com a imprensa, ou pelo menos com o pedaço supostamente mais influente dela.
Luiz Inácio Lula da Silva costurou uma base política para enfrentar a opinião pública.
Já Dilma, até agora, percorre o caminho oposto. Apoia-se na opinião pública para enfrentar a própria base.
Pois precisa tomar o comando do governo que ela deseja comandar. Um governo que sua excelência recebeu descentralizado além da conta.
Nessa inversão, o discurso de viés governista contra “a mídia” soa como ideia fora de lugar e de hora.
Os tempos são (bem) outros.
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